quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Do escuro à luz

SONETO 34 INSONE

Ser cego é como estar numa prisão.
Ficar cego é pior, parece o sustode quem foi livre e sofre o golpe injusto,
levado para o hospício estando são.

O sonho é colorido, pois estão
bem vivas na memória, a muito custo,
imagens dum recente e já vetusto
passado de prazer e perversão.

Nenhum ouvido escuta meu apelo.
Acordo e lembro em pânico que o sonho
foi falso: a realidade é o pesadelo.

Só volto a adormecer quando componho
sonetos sobre o pé. Gozo ao lambê-lo,
e agora o escuro não é tão medonho.


Pedro José Ferreira da Silva, nascido em 1951 na capital paulista, descreve em seus doze anos de trabalho, dentre outras experiências, a de aos poucos ver o mundo ficar escuro.

Poeta, ficcionista, ensaísta, letreiro e atualmente colunista, Glauco Mattoso, assim denominado por ser portador de glaucoma, doença congênita que lhe acarretou perda progressiva da visão, até a cegueira total em 1995, além de fazer alusão a Gregório de Mattos, em quem se inspira, já trabalhou em panfletários - Jornal do Brabil e O Pasquim – em jornais diários – Jornal da Tarde- e até mesmo em quadrinhos.

Com uma produção de textos ‘dividida’ em duas fases, a visual e a cega, o poeta aborda os mais variados e polêmicos temas. Enquanto a primeira se destaca por privilegiar a parte visual, gráfica, passando pelo modernismo até o underground, a segunda, quando o autor já estava privado da visão, se firma nas métricas e ritmos com uma linguagem extremamente coloquial.

Glauco Mattoso, atualmente contribuinte da revista Caros Amigos não viu no breu um impedimento para continuar a viver, afinal, como disse Chico Buarque de Holanda, ‘os poetas, como cegos, podem ver na escuridão’.

Um comentário:

Anônimo disse...

otima materia